Tristeza nas rodovias

Oscar Bessi

As estradas do Vale da Felicidade são belíssimas. Atravessam paisagens relaxantes, até afrodisíacas, entre verdes e curvas, entre cidades intensas e lugares com nomes significativos. Mas um olhar mais atento às notícias que se repetem — ou quando se ouve uma sirene ao longe — percebe que, para além desta aparente tranquilidade com jeito de pintura impressionista, há uma certa tensão. E dores que se repetem no asfalto manchado por pressa, distração e descuido – não apenas por parte dos condutores, mas talvez dos gestores das rodovias.

O Rio Grande do Sul tem tido uma rotina desagradável de acidentes fatais em suas rodovias. As estatísticas extrapolam os gráficos e viraram rotina nos noticiários e no luto nas famílias. Temos perdido gente demais nesta batalha, todos os dias. O problema parece se repetir como um eco. O que está acontecendo?

O diagnóstico é complexo, mas conhecido. Estradas antigas, mal conservadas ou mal sinalizadas, projetadas para um tempo em que o trânsito era bem diferente em intensidade, quantidade e forma. Veículos modernos que correm mais do que a prudência permite. Falta de fiscalização, com o desamparo em recursos humanos das forças policiais que cuidam estradas tanto federais quanto estaduais, somada ao velho vício tão nosso de “dar um jeitinho” e acreditar que o perigo sempre é do outro. Adicione-se a isso a pressa, a impaciência, a imprudência, o celular, o álcool – e temos a receita de uma tragédia anunciada.

Mas talvez o problema mais profundo não esteja no asfalto, e sim na alma. Há um tipo de arrogância coletiva que domina o trânsito: uma mistura de individualismo e negação do risco. Cada motorista se imagina senhor do tempo e das leis da física. E o resultado é o mesmo: vidas interrompidas, famílias dilaceradas. Reverter essa realidade não é apenas tarefa para engenheiros ou policiais rodoviários. É tarefa civilizatória.

Precisamos de estradas melhores, sim, mas também de motoristas melhores. De educação para o trânsito desde cedo, de campanhas que não apenas assustem, mas que despertem empatia. Que cada condutor entenda que dirigir é um pacto com a vida — a sua e a do outro. E que o Estado invista não só em asfalto, mas em consciência. Educação. Coisa que pedágio não me parece incluir no seus pacotes de “benfeitorias” pagas pelo cidadão.

Mas um bom primeiro seja reduzir a velocidade, respirar e seguir em frente com a humildade de quem sabe que o verdadeiro destino não é chegar rápido, mas chegar vivo. E que, além da gente, existe um outro. Tão importante quanto.

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