Que venha 2026!

O calendário vira, outra vez, como a troca de guarda que se repete num ritual de mesmices, ainda que refutemos esta ideia. E celebremos a noite da virada entre fogos, aplausos e toda a euforia possível para fugir da ideia de que seria apenas o som seco de mais um ano assumindo o seu posto. Sem ideia do que vai acontecer durante o seu turno de 365 dias. E 2026 chega com a velha pergunta de sempre, cuja resposta não cabe em taças de espumante: o que, afinal, nos espera? Pessoalmente, faremos promessas e planos, ainda que boa parte se dissolva antes mesmo que passe a ressaca do réveillon. A esperança, coitada, esta tenta entrar sempre pela porta da frente, mesmo sob empurrões, enquanto a desconfiança se esgueira pela janela, trazendo na sola do sapato a lama das conjecturas políticas mal explicadas, da estupidez banalizada nas redes sociais, das enchentes recentes com calor fora de época ou um frio que já não respeita estações. Tudo isto e muito mais numa sensação de que o mundo enlouqueceu antes mesmo do que nós – e não podemos fazer mais nada para mudá-lo.
No Brasil, o novo ano também veste palanque. As eleições estaduais e nacionais se aproximam como um temporal anunciado: todos sabem o que vem, mas ninguém sabe exatamente como e muito poucos confiam nas previsões. A polarização segue firme, musculosa, alimentada a ódio e desinformação, como se governar fosse um esporte radical em que o adversário precisa ser eliminado, não convencido. Como se ideologia moldasse caráter, quando nas cúpulas as cabeças todos se igualam na podridão essencial, no que fica bem distante dos meros discursos de bandeirolas fabricadas para engambelar nas redes sociais e insuflar mentes fanáticas, nada além disso. Ideias? Projetos? Agulhas no palheiro. E o diálogo, ah, este anda tão raro quanto um verão ameno. O futuro parece disputado aos gritos, não às ideias.
Aqui pelo Vale do Caí o ano novo chega com promessas recicladas, dessas que já perderam o rótulo de tanto reaparecer. Fala-se em rodovias com problemas, estes já na terceira idade, e em melhorias urgentes que nunca acontecem, ou projetos que vivem no gerúndio eterno: “serão analisados”, “estão em estudo”, “aguardam recursos”. Estradas estaduais e federais que seguem esburacadas, remendadas como colchas feitas às pressas, enquanto caminhões, ambulâncias e sonhos dividem o mesmo asfalto judiado. E provocam atentados diários à vida. A região cresce, produz, insiste. Mas parece sempre esperar na fila errada.
Há algo de satírico nisso tudo, é verdade. Um certo humor amargo em ver autoridades descobrindo, todo ano, que a chuva molha, que o rio sobe e que estrada ruim atrasa a vida. Mas também há poesia no gesto silencioso de quem acorda cedo, enfrenta desvios, improvisa caminhos e segue. Por aqui, como tantas cidades pequenas e médias do Brasil, sobrevive-se menos por promessas e mais por teimosia. Uma teimosia bonita, guerreira, resiliente. Embora exausta. E o cansaço é o maior inimigo do sonho bom.
O ano novo, no fim das contas, não é um salvador. É só um espaço em branco onde seguimos escrevendo com a letra que temos. Que o 2026 nos encontre menos crédulos, mais atentos, menos furiosos e um pouco mais responsáveis pelo lugar onde pisamos. Se vier com sol, que não torre nossas sementes e frutos, nem evapore nossos suores e lágrimas sem dar trégua ou explicação. Se vier com chuva, que ao menos encontre pontes firmes, estradas decentes e pessoas dispostas a reconstruir não apenas o que a água leva, mas também o que o ódio insiste em corroer. Enfim. Que 2026 seja um ano bacana para o máximo de boas almas que ele, apesar de tudo, consiga ser.



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